quinta-feira, maio 14, 2015

O casamento da Preta Gil

Por Andre Porrastieri
Coluna Fora do Beiço

Não existem palavras na língua portuguesa para descrever o casamento de Preta Gil. “Do cacete”, “poutaquelamerda” e “o bem-casado tava mara!” são expressões, não palavras. Precisaríamos da precisão zombeteira de Kiko Zambianchi. Da capacidade de indignação de Luiz Carlos Alborghetti. Da compreensão do subdesenvolvimento de Alexandre Frota. Do ouvido apurado e brutal de um Serginho Chulapa.
Sem um milésimo do talento de nenhum deles, resta focar nos fundamentos do jornalismo: siga o dinheiro (galera do RH, cinco e meia tô passando aí, e sem desculpinha dessa vez!).
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Quem pagou pelo vestido com trocentas pérolas vivas? A festa para 700 figurantes do Esquenta? Os 35 seguranças multiétnicos, os 14 lustres com cristais baccaralho, milhares de flores, whisky,  champagne e ex-maridos? O aluguel da Igreja Nossa Senhora do Carmo (recentemente rebatizada Igreja Nossa Senhora Dona Canô, por pedido de Caetano), a mais fina da cidade? A descrição é indescritível: “o grande movimento de carros nas ruas estreitas de Santa Teresa (rebatizada Santa Tereza Rachel por pedido de Wolf Maya) causou um nó no trânsito, já que os convidados param em frente à casa para entrar no evento. Alguns ônibus não conseguiram passar e passageiros desceram a rua escura a pé reclamando por terem dado de cara com Vera Loyola.”
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Sabemos quem não pagou: o noivo, personal trainer, que está desempregado desde que colocou a noiva como o destaque do seu currículo. E sabemos o que não pagou: a carreira de Preta Gil. Tudo que ela toca vira Preta Gil. Grava discos que ninguém baixa, faz shows em que as pessoas pensam que ela está só fazendo sala até a Ivete chegar, não emplaca em mérdia nenhuma. Jamais decolou ou decolará, pois muito mais pesada que o ar. Pode andar 50 quilômetros por qualquer grande cidade brasileira e não será reconhecida – mas deveria andar mesmo assim, todos os dias.
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Talvez papai e mamãe, Gil e Flora (alguém já batizou o casal como Floragil? Se não, é meu! Gostei, parece remédio pra flora intestinal, mas do tipo que solta o intestino)? Casamento de filha é oportunidade única para se exibir, e essa foi a terceira oportunidade única de Gil casar Preta. Mas esse não é só o casamento da filha de um homem rico, de um ex-ministro. É uma reunião de algumas das pessoas mais famosas do Brasil. Algumas muito amadas pelo povão. Outras sem fama, mas perfeitas ilustrações do que é feito o nosso país. 
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E Preta Gil, em seu primeiro papel como protagonista. Desconhecia o casal Amora Mautner e Arnon Collor de Mello. Ela é filha acho que daquele Jards Macalé (não sei direito que apito toca), ele de Fernando Collor (jet ski, Presidência da República, supositório). A poesia alternativa, a tirania alagoense, novela, é tudo a mesma coisa. A arte no Brasil sempre acaba em farsa. E novela, em casamento. É, em farsa também.
Por isso é que o Rio continua sendo nossa verdadeira capital – tá lá aquele Jesuzão mostrando quem manda no Congresso atual. É o lugar da fama, do poder e do Biscoito Globo. Do dinheiro público, que move as engrenagens da fama e do poder (e do Biscoito Globo?). Ninguém nas nossas artes personifica esta proximidade proveitosa do poder tão bem quanto Gilberto Gil. Conforme sua carreira decaía, se transmutou em ongueiro, reggueiro, ministro e muleque piranha de dread. Graças às leis de incentivo à cultura, pintou uma graninha boa para o Gil assim que deixou o ministério – com ela, produziu os espetáculos “Gil Brilhante”, “Todo o Gênio de Gil”, “Paranauê É Com o Gil”, “Gil, o Shogun do Harlem” e “Gil, o Flagelo dos Deuses”.
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Quando você embolsa dinheiro público para bancar seus corre artísticos, está fazendo um negócio, e ótimo, porque sem risco. Se ninguém aparecer para assistir ao filme que você produziu, dane-se, você já ganhou o seu. É o que acontece com 90% dos filmes bancados via lei de incentivo. E MESMO ASSIM O FÁBIO PORCHAT VEM RECLAMAR QUE TÁ PASSANDO “VELOZES E FURIOSOS 7 – KEEP PAUL WALKING” DUBLADO NAS CINCO SALAS DO MULTIPLEX DO BAURU SHOPPING EM VEZ DO FILME DE ABELHA DELE! Lei de incentivo compra a cumplicidade da classe artística, que a vende baratinho. Ontem mesmo arrematei a integridade artística da Claudia Leitte no Mercado Livre. Novinha, nunca usada.
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Quem é chegado dos poderosos sempre garante suas bocadas. Juca Ferreira está lá no Ministério para garantir que o que tiver de verba, vá para as mãos “certas” (Maria Bethânia, estou vendo você aí, com as mãos “certas” estendidas… um vestido branco longo… pés descalços, os cabelos caídos sobre o rosto… Brrr…). O casamento de Preta pode durar para sempre ou acabar semana que vem, que é o que acontece frequentemente com esses enlaces espetaculosos. O descaramento é para sempre. E, no caso da Ângela Bismarchi, a virgindade também.
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Não nos faltam só palavras para descrever o que foi esse casamento de Preta Gil. Nos faltam também escritores. Precisamos muito de alguém com o talento e a coragem para tranformar em literatura a seguinte notícia, de dezembro de 2014: “o Ministério da Cultura autorizou a captação de R$ 6,5 milhões de reais para a peça Gilberto Gil, o Musical.” Gilberto Gil, o Musical. Atores dizendo naquele jeito cantado trocadilhos como “Parabolicamará”, algum deles caracterizado como Punk da Periferia com cabelo moicano roxo, pulseira de tachinha e camiseta do Iron Maiden, e um ato inteiro de odes a um abacateiro… Stephen King, precisamos de você.
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http://foradobeico.tumblr.com

Um comentário:

  1. Até esculhambar com o "talento" de Preta e seu casamento "espetaculoso", tudo nem. Porém, não coloque no mesmo balaio pai e filha. Respeite a obra, o talento e a história de Gil.Entrou na política, foi financiado pelo governo, tá.Entretanto, não seja irônico com quem está aí marcando território há 05 décadas. Há quanto tempo você está na mídi. Quem te conhece? Eu desconhecia. Deboche de quem merece. E tem muitos.Acho até que você se incluiria.

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